Breves Apontamentos Sobre os Dias e as Horas Planetárias.

Um dos conceitos mais primários da Magia Astrológica é o conceito de Dias e Horas Planetárias. Este artigo irá comentar algumas das variações desse tema. Desde já, adianto que muitas das fontes deste artigo vêm do blog Thavma.

I. A Versão Tradicional.

A abordagem mais tradicional das horas planetárias é aquela que é apresentada, dentre outros lugares, no Heptameron, atribuído a Pietro d’Abano, no qual, no capítulo XXV, é apresentada a tabela de dias e horas planetárias com o Arcanjo correspondente.

Este cálculo é brevemente explicado: com base na estrela setenária, à qual se distribui, na Ordem Caldeica, externamente, os planetas e, internamente, se obtém a Ordem dos Dias da Semana:

Definido o dia da semana de acordo com esse sistema, passa-se a dividir o dia em doze horas do nascer ao pôr do sol e mais doze horas do pôr do sol ao outro nascer do sol. Considera-se que o dia começa com o nascer do sol e termina no nascer do sol do dia seguinte. A primeira hora sempre é regida pelo regente do dia e, as horas subsequentes, seguem na Ordem Caldeica.

Assim, a primeira hora do dia do Sol é regida pelo Sol, a segunda por Vênus, a terceira por Mercúrio, a quarta pela Lua, etc., até que, findo o dia (e noite) do Sol, na manhã do dia seguinte, a primeira hora é regida pela Lua, regente do Dia.

II. Comentários Sobre o Sistema Tradicional.

O primeiro comentário sobre esse sistema, o mais conhecido de todos, é que ele possui uma coerência interna invejável. Matematicamente, ele usa os sete dias da semana (que são baseados na órbita de 28 dias da Lua ao redor da Terra), os sete planetas, a Ordem Caldeica e a divisão do dia e da noite em doze horas diurnas e doze horas noturnas de forma que a primeira hora do dia sempre é regida pelo regente do planeta.

A mera coerência interna do sistema coloca em xeque a utilização dos planetas trans-saturnianos na astrologia. Como pode alguém pretender utilizar Urano, Netuno e Plutão sem uma semana de dez dias que é completamente dissociada da órbita da Lua? Ou sem um dia de 23 horas que não se dividem igualmente entre dia e noite? Ou sem um dia de 36 horas, metade delas de menos de 40 minutos?

Além disso, deve ser destacado que o Sistema Tradicional possui, na maior parte do tempo, horas diurnas e noturnas com tamanho diferente em virtude das variações de nascer e pôr do sol durante as estações. Longe de ser um prejuízo, isso apresenta um sistema com maior correlação com os ciclos naturais.

Embora tal sistema não possua uma datação ou fonte histórica que seja indicada como seu nascimento, certamente deve datar de práticas pré-históricas. O Judaísmo, sendo notoriamente uma religião Saturniana, utiliza o mesmo sistema para calcular o Shabbat, fixando como momento do começo do dia planetário o pôr do sol. Datando o rito Saturniano do Sabbat de uma fase anterior à escrita, certamente esse sistema de dias e horas planetárias também é anterior à escrita.

III. Por que Terça-Feira é Terça-Feira?

Uma questão importante sobre o sistema acima é mencionada nos meus cursos de astrologia: por que terça-feira é terça-feira? Quer dizer, ok, o sistema de fixação dos dias e horas planetárias é coerente internamente, mas quem foi que, pela primeira vez, acordou e disse “Hummm… hoje vai ser dia de Saturno, amanhã dia do Sol, etc.”?

Tal questão é relevante porque, efetivamente, esse é o único elemento arbitrário do sistema.

As respostas para isso são, na minha opinião, duas possíveis: ou é herança das práticas pré-históricas, quando alguém com a percepção espiritual absoluta “sentiu” que era dia de Saturno (e isso fica muito atrapalhado com as mudanças de Calendário), ou é meramente uma convenção (como é o dia 31 de dezembro ser o fim do ano).

Em resposta a esse problema, ouvi uma proposta que é interessante, mas não encontrei nenhuma referência bibliográfica a respeito: define-se o mês como um ciclo lunar, de lua nova a lua nova, atribuindo-se ao dia da Lua Nova o primeiro dia do mês e à regência de Saturno, seguindo-se posteriormente a ordem da estrela setenária. A divisão das horas seria a mesma. Esse sistema, segundo um amigo, é de conhecimento público da Aurum Solis, porém, nem Mellita Dennings e nem Osborne Phillips fazem referência a eles nos livros de fundação (ou re-fundação) da Aurum Solis: Mysteria Magica, Planetary Magick, Foundations of High Magick ou The Sword and Serpent.

É um argumento que fala mais sobre minhas dificuldades em pesquisar do que sobre a realidade, mas, me parece improvável que um sistema tão específico e importante, ensinado pela Aurum Solis, não possua qualquer menção nos livros mais importantes dos fundadores da Ordem, de Agrippa, de Trithemius ou de quaisquer outros grandes grimoristas.

IV. Variações do Sistema Clássico.

Já se mencionou que o sistema clássico, provavelmente, derivou do judaísmo, que celebra o Shabbat na primeira hora do dia (ou noite, talvez seja mais adequado) de Saturno, porém, outras variações pequenas existem.

Mathers apresentou tabelas (com erros) da Chave de Salomão e, pior, tomou por base horas de 60 minutos para dividir o dia. O erro de proposição das tabelas não é grave pois não é conceitual (a hora de início do dia foi 5:00, uma hora mais cedo), porém, tomar por base a hora de 60 minutos parece um tanto desconectado da natureza.

A Thavma apresenta uma tabela, supostamente retirada do livro de Daniel Harms Of Angels, Demons and Spirits na qual o mesmo sistema é apresentado, mas com indicação de que as horas seriam ante meridiem post meridien. Segundo eles, isso implicaria em uma divisão que seria de meio dia a meia noite e vice versa:

Apesar de ter procurado o manuscrito de onde esse diagrama saiu (e não ter encontrado para poder criticar propriamente), não apenas considero impertinente a atribuição de horas com base em um conceito arbitrário de meio dia e meia noite (convenhamos: é bem mais difícil marcar meio dia e meia noite que o nascer ou o pôr do sol) como ainda questiono: no diagrama, ante meridiem pode dizer respeito tanto ao hemisfério superior quanto ao hemisfério esquerdo da imagem.

V. O Sistema de Abramelim.

Provavelmente o sistema de Abramelim apresenta a proposta mais diversa da tradicional, sugerindo que o Dia Planetário é quando o planeta está acima do horizonte e a hora planetária é quando ele está próximo ao meio do céu. Segundo ele, usar o outro sistema é um “erro grosseiro”.

Não posso mencionar que o sistema Tradicional seja um erro, posto que obtive sucesso nas operações das quais participei e que foram realizadas naquele sistema. Além disso, em se tratando de magia grimórica, é importante seguir a coerência interna do Sistema.

A avaliação do Sistema de Abramelim, porém, parece muito mais uma avaliação astrológica pontual. Não é errado afirmar que um planeta próximo ao meio do céu esteja em seu momento de maior poder. De fato está. Mas isso não pode ignorar todo o resto (combustão, aspectos, séquito, etc.).

Assim, não sei se é possível afirmar uma contradição entre o Sistema de Abramelim e o Sistema Tradicional, mas, provavelmente, eles possuem utilidade e fundamento independente.

VI. Aplicação do Sistema Clássico.

Não se discutirá a “aplicação” do Sistema de Abramelin, afinal, ele é, básica e grosseiramente, um exercício de Astrologia Eletiva.

No que tange ao sistema tradicional, ele tem como fundamento, primordialmente, a prática de magia evocatória. Suposta e tecnicamente, os resultados da magia evocatória dependeriam ou estariam favorecidos pelo uso dos dias e horas planetários adequados. Os autores, porém, divergem a respeito da atribuição arcangélica:

Agostino sugere que as horas planetárias dizem respeito ao objeto enquanto o dia ao contexto. Portanto, magia para atrair dinheiro deveria ser feita na hora de Júpiter (dinheiro) dia de Vênus (atração). Não posso concordar ou discordar dessa afirmação. Ritos com objetivo específico costumo trabalhar com algo semelhante ao proposto no Sistema de Abramelin. Além disso, apesar de respeitar ao extremo as instruções ritualísticas, aparentemente o Ritual é um conjunto de fatores que se somam em uma resultante. É praticamente impossível isolar os elementos constitutivos para fazer uma análise qualitativa.

VII. Conclusão.

Na verdade, esse texto não tem nenhuma conclusão exata que não o fato de que, estudado  com profundidade suficiente, nada é simples.

A lógica do cálculo é óbvia, porém, não explica elementos pressupostos fundamentais: por que os dias começam no nascer do Sol (para os Cristãos) ou no pôr do Sol (para os judeus e outros pagãos)? Por que terça-feira é terça-feira? Afinal, qual atribuição de Arcanjos é a correta?

A busca por uma lógica objetiva é fundamental, posto que tem como princípio que a o espírito humano nasce da interação da alma com a Criação e, nesse sentido, aparentemente existe um limite ao racionalismo, que precisa ser unido ao empirismo.

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2 respostas para Breves Apontamentos Sobre os Dias e as Horas Planetárias.

  1. Julio diz:

    Cara eis me aqui, aprendi a fazer o cálculo pelo sistema tradicional, cheguei a seguinte conclusão, ela é uma fórmula matemática, tipo uma progressão, que a ordem sempre da exata, desde então estou estupefato, porém tá difícil ir mais fundo nos estudos, sorry

    • astrologiapv diz:

      Júlio, a melhor resposta que eu tenho é a de que esse sistema foi construído para ser exato. A única coisa que quebra essa teoria da adaptação matemática humana é que a órbita da Lua é perfeita nele. É razoavelmente fácil criar um sistema com um determinado número de planetas e dividir o dia nas horas decididas (afinal, as horas são artificiais). Mas quando você coloca as coisas objetivas nisso, fica divino: a semana de sete dias e o mês de quatro semanas baseados na lua muda tudo.

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